quinta-feira, 14 de janeiro de 2016

Arrogância Matutina

Por Jairo Santana

Eu sou o indivíduo mais modesto do mundo. O suprassumo da modéstia humana. Apesar de ser hors-concours, por pura discrição, participei recentemente da Copa Mundial da Modéstia, realizada num vilarejo modesto da Dinamarca, um também modesto país nórdico. Participaram acanhados de todos os cantos mais modestos do mundo. Modestamente, fui o campeão. Também ganhei o segundo e o terceiro lugares.

Disseram ser impossível alguém ser tão moderado, tendo tantas qualidades notórias, experiências fantásticas e um currículo invejado por todos. Mas lá estava eu, recatado, estampando para a sociedade arrogante que sim, eu existia. Todos ficaram orgulhosos de minha modéstia. Eu não. Sou modesto.

Não fiz discurso. Modestos não gostam de aparecer. Balbuciei apenas algumas palavras imerecidamente julgadas como brilhantes, ali mesmo, sóbrio, da plateia. Usei modestas duas horas e meia, tirando o exórdio e a peroração. Aplaudiram de pé, ainda que eu dissesse, modestamente, que aplauso é para quem sabe brilhar.

Durante o evento, a hashtag ‪#‎Homemmodesto‬ ficou no topo dos Trending Topics do Twitter mundial, foi o centro das discussões no Facebook e fui obrigado a conceder entrevistas aos mais renomados veículos da imprensa mundial. Até hoje me pergunto o porquê de tanto interesse por uma figura tão modesta assim. O mundo talvez precise de exemplos para entender que o simplório deve ser valorizado.

Historicamente, porém, não me julgo o mais modesto. Houve um outro que era Deus e que se fez homem. Ficou famoso. Você deve conhecer. Aquele sim era modesto. Eu, modestamente, jamais admitiria que sou Deus, ainda que tragam tantas evidências sobre isso. Então, eu sou o segundo maior modesto da história da humanidade. Digo isso porque sou modesto. Há quem diga por aí que sou o maior. Eu me acho o mais singelo.

Não costumo divulgar a minha modéstia. Escrevo apenas aqui, neste local modesto, sabendo que poucos se dedicarão a ler um texto tão modesto quanto este, recatadamente de pobreza vocabular notória.

Eu nunca coloco a modéstia à parte. A parte da modéstia me toma como um todo. Não há espaço para deixar de ser modesto. Seria arrogância de minha parte deixar evidente as minhas qualidades. Sou humilde.

Texto publicado originalmente em 04/01/2016 na minha página no Facebook

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